sábado, maio 29, 2004

O bondoso Januário

Depois de ler o excelente conto do JVC, postado no Professorices, lembrei-me dum negro que conheci na minha infância. Embora não possa recorrer à excelente prosa do meu ilustre amigo, gostaria de partilhar esta “estória”, infelizmente não ficcionada, dado que para isso não tenho nem engenho, nem arte.
Na minha meninice passávamos o Verão no Pópulo, em casa do meu Avô. Nesse tempo o Pópulo era um pequeno aglomerado de uma dúzia casas de veraneio e de três ou quatro residentes permanentes.
Na casa ao lado da nossa, vivia uma numerosa e simpática família. O Avô, um velho major das campanhas de Africa do séc. XIX, trouxera de lá, em circunstâncias que desconheço, um pequeno negro que, a troco de pão e uma enxerga, toda vida trabalhou para aquela família. Conheci-o velho, muito velho, com mais de oitenta anos, com a carapinha e uma mal semeada barba totalmente brancas, andando com imensa dificuldade, com um terno olhar baço e um sorriso triste. Vivia num anexo da casa, num quarto de chão térreo, ladeando o grande pátio onde, despreocupadamente, brincávamos. O Januário assistia às nossas brincadeiras silencioso, sentado num pequeno banco de madeira colocado à porta do seu quarto. Assistia, mas estou certo que não as via. O seu olhar triste e baço estava noutro lugar. Talvez na sua querida e distante África que tão cedo abandonara.
Num dos verões, em 1951 ou 52, vieram ao Pópulo passar férias, de Moçambique, umas primas nossas. Teríamos todos entre 6 e 10 anos de idade. Eram elas umas lindíssimas crianças, de aspecto nórdico, com cabelos loiríssimos e olhos claros. Num dia em que fomos todos brincar para a casa dos nossos vizinhos, mal entraram viram o Januário sentado no seu banco, atiraram-se a ele, aos abraços e beijos, pela saudade que já sentiam da “sua” África longínqua. Atarantado, o bom Januário correspondia às carícias das nossas primas, chorando convulsivamente. Não percebemos porquê e, sempre que elas lá iam, a cena repetia-se. Só mais tarde soubemos a razão da comoção do bondoso Januário. Nunca, durante a sua longa vida, alguém o abraçara, acariciara ou beijara!
Morreu o Januário, ainda éramos crianças, tão obscuramente como vivera, na obscuridade do seu imundo quarto. Ao menos levou consigo, como única alegria da sua vida, as carícias e os beijos das nossas encantadoras primas!


(Carlos F. Afonso)
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Contemplação

Cobre-se o Vale
de religiosa calma!

Melodias da aragem
afagam canteiros floridos
e bailam
de mansinho
onde de cor na Natureza!

Adivinho, ao longe, o mar
- sinfonia de espuma -
desenhando rendilhados de fantasia
na quietude da areia!

Farrapos de núvem
beijam a montanha!

Elevo o pensamento
e liberto a Alma
sobre a verdura dos matagais
demandando o Céu
que vem ao meu encontro!

Embalam-me claridades
e fico no sonho
de não habitar a Terra
de ter alcançado o Infinito!...


(Artur Lobato,...em Ogiva, 1958)
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sexta-feira, maio 28, 2004

Rock In Rio

Começa hoje, quase daqui a nada.
Como supostamente não serão concertos normais - em termos de dimensão - por questões de segurança e aversão a "ayuntamentos" deste tamanho (ou do tamanho que se anunciava), não vou.
Mas nem por isso deixo de desejar boa sorte para a organização e bons momentos para os espectadores.
Momentos de boa música e diversão, em segurança.
Sem as correrias, mordidelas ou batidas que marcaram outros festivais de rock, como soube aqui.

PS - Conheço alguém que tem um bilhete para Britney Spears e que não vai poder utilizar. Quem estiver interessado deixe contacto de e-mail.

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quinta-feira, maio 27, 2004

Os anúncios da nossa memória

Um hilariante post do André sobre Alinhamentos (de um possível telejornal na RTP/Açores) e o acutilante (as always) comentário do ToZé sobre a notícia do "Homem ataca com caneta BIC Laranja", não me fez pensar em política, não (tento sempre não pensar nela, não escrever sobre ela, para não me irritar).
Fez-me ouvir, no eco da minha memória, a musiquinha: BIC Laranja, BIC Cristal, duas escritas à sua escolha...BIC Laranja da escrita fina, BIC Cristal da escrita normal...BIC BIC BIC, BIC BIC BIC

E depois deste, outros anúncios vieram à minha memória (só visual, ou integral).
Pasta Medicinal Couto: com um excelso malabarista rodopiando uma cadeira segura nos seus dentes...
A Família Prudêncio, que usava os pesticidas com cuidado: o anúncio em BD que ainda passava na RTP/Açores quando fui viver para São Miguel...
E o anúncio da Rádio:
Professor: "Menina, quantos polos conhece?"
Menina: "3. Polo Norte, Polo Sul e Polilon."
Professor: "Polilon???"
Menina: "Sim. Polilon são os fechos de correr que a mãmã usa. A mamã e as outras senhoras."

Estes, e outros, são anúncios da minha memória. Hoje ainda se fazem excelentes anúncios mas que cada vez menos guardo na memória, tal é a catadupa com que nos presenteiam.
E vocês?

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Um convite

Bem sei que os Açoreanos que aqui vêm vão também ali ao lado e podem, por isso, já ter conhecimento.
Mas fica aqui o convite que foi deixado em comentário.

"Convido todos os participantes(residentes em S. Miguel) deste blog a participarem numa noite de poesia açoriana, pelo grupo de teatro Amphitheatrum na Rotas da Ilha Verde, Rua Pedro Homem, 49 P.D. dia 29, a partir das 20h"
Mário Roberto

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Sosseguem os Benfiquistas

Trago-vos as palavras do ferrenho portista Miguel Sousa Tavares para vosso sossego: "o espírito relativamente a essa querela da Taça de Portugal e do Benfica é que, o Porto não quer essa Taça de Portugal."
Como eles não a querem, a Taça é vossa. Foi isto que entendi. Entendi bem?

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Ele dixit o Estado não faxit

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Espelho meu, espelho meu...

Ora, face a esta possível novidade - o transplante facial - digam lá de vossa justiça: qual era a cara de pau a quem vocês aconselhavam o transplante?

Eu...Manuela Ferreira Leite.

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Que "emuçoe"



Fora a taça (nacional...e o que é nacional é bom), este foi o ano deles.
Parabéns...
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terça-feira, maio 25, 2004

Estive ou não estive?

Eu sei que esta vossa dúvida, de eu ter estado ou não na boda do futuro rei de Espanha, não interessa nada.
É evidente que não estive.
É evidente que depois da confusão dos dias anteriores nem me atrevi a "descer" ao centro de Madrid.
Quem sai aos seus não degenera e "ayuntamentos" também me arrepiam.
Tento não pensar nisso quando ando de metro ou quando vou a um jogo de futebol ou aos Santos Populares.
Em vez de ir ver os príncipes e de me molhar à chuva, fiquei calmamente lendo (e também sofregamente, porque o livro entusiasmou-me) à espera que "escampasse"* Com a TVE ligada, ia espreitando nas pausas.
Escampou e o resto do dia foi como os outros: gastando as minhas pernas mas enchendo a minha alma (e vazando um pouco um bolso).
Mas como diz o dito popular "se Maomé não vai à Montanha, vem a Montanha a Maomé", e por isso alguns principes (mas não os noivos, obviamente, pois deviam ter mais e melhor a fazer) acabaram a "tomar copas" no mesmo sítio que eu.

*parasse de chover, como se diz na ilha...


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segunda-feira, maio 24, 2004

Back!!

Desculpem-me o atrevimento linguistico, mas o fim de semana baralhou-me as ideias a este nível.
Era ver-me a falar espanhol com portugueses, inglês com espanhóis, e português com uma sueca...
Mas ou é assim, ou não tem piada!
Tal como já não tem graça deixar algumas compras para a última hora, no aeroporto, para se gastarem os últimos "tustos" na moeda locar...quando essa moeda é o Euro.


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sexta-feira, maio 21, 2004

Consolada

Estou exausta mas consolada, como se diz na ilha.
Madrid está esplendorosamente enfeitada e nem a chuva parou esta gente. Amainou, é certo, pois hoje vêm-se menos almas nas ruas. Mas cá continuam a passear.
Já percebi que ontem era a atracçao pelas iluminaçoes especiais que hoje nao foram acesas (hoje o Palácio das Comunicaçoes mantém-se iluminado, com as luzes brancas habituais, mas a fonte de Cibelles está às escuras).
O trânsito foi cortado nas principais artérias. Gran Via, Alcalá, Cybelles (e ao que sei o Passeio del Prado, onde hoje nao fui) sem carros.
Para além dos dias europeus sem carros - onde em Lisboa sao umas horas, em zonas muito restrictas e onde se vao avistando os transportes públicos - a única vez que vi uma via principal de uma grande cidade sem trânsito foi em Nova Yorke, em 1998. A Brodway na zona de Times Square e esta "praça" sem carros porque tinham caido umas peças de um prédio em obras.
Hoje neste centro de Madrid, onde estou, em vez de tubos de escape avistam-se guarda-chuvas, que infelizmente nao se vendem na rua nem no metro como em Lisboa.

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quinta-feira, maio 20, 2004

Notícias

Depois de um dia de trabalho e de quase 5 horas de andamento,a pé, eis que avisto um bar com computador e venho dar-vos notícias.
22h35m e Madrid parece o Rossio na hora de ponta. Gente, gente, gente....polícia, polícia e mais polícia.
Pela primeira vez sinto-me segura a andar sozinha a estas horas da noite numa cidade, capital europeia.
A excitaçao* do povo é geral. Enconstam-se a qualquer murete, a qualquer barreira de ferro para olhar para uma varanda ou janela que se enfeita com panos rosa (escuro e claro) ou beje, para os arranjos de flores que continuamente (desde ontem) estao* a ser colocados nos espaços verdes, para as fontes e monumentos que parece que hoje estarao* iluminados pela última vez uma vez que irao* ser retirados os holofotes (será que foi isto mesmo que eu ouvi na TVE???), ou simplesmente passeiam.
Como eu, que aproveitei hoje para ir para os lados de Almudena e do Palácio Real uma vez que nesta estadia nao* conto lá voltar.
Plaza Collon, Cibeles, Portas del Sol, Plaza Mayor, tudo está no mesmo lugar, mas tudo está com um ar limpo, de festa.
O que mais retive: na praça de Portas del Sol já está uma placa em memória das vítimas de 11 de Março; as faixas que enfeitam as janelas e varandas têm um "M".
"M" de Maio mas que também podia ser de Março (mês das vítimas) e que é também de Madrid.


* Este teclado só tem til sobre o Ñ
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sábado, maio 15, 2004

A vida de Madre Teresa da Anunciada

O Padre José Clemente, Presbítero da Ordem de S. Filipe Nery, escreveu este célebre livro em 1763, patrocinado pela Condessa da Ribeira Grande, Margarida Tomásia de Lorena, supostamente para glorificar e descrever a vida da “Venerável”. Este famoso livro, também conhecido por “Livro do Senhor Santo Cristo”, é ainda usado hoje por algumas videntes na ilha de S. Miguel, para fazer previsões, dar orientações, etc. A sua leitura, porém, para um iconoclasta não iluminado pela fé, conduz a um resultado precisamente contrário. A edição que possuo é de 1865 e as transcrições que farei serão nela baseadas.
A Madre Teresa da Anunciada nasceu e foi baptizada no dia 25 de Novembro de 1658, na freguesia de São Pedro da então vila da Ribeira Grande. Filha mais nova de 13 irmãos, foi criada por sua mãe com tais desvelos e carinhos, poupando-a a todas as tarefas domésticas, já que a própria Teresa dizia que “ se inclinava mais a ser Maria para o descanso do que Marta para o trabalho”, o que levou as suas próprias irmãs a classificarem-na de “mimosa e malcriada”, (pág.7).
Já a mãe, tida como vidente na Ribeira Grande, era classificada “à boca cheia de hipócrita e embusteira”
( pag.12).
Entrou para o Convento da Esperança onde iniciou o seu noviciado, em 19 de Novembro de 1681, vindo a fazer os votos solenes em 23 de Julho de 1683. Morreu, com fama de santidade, em 16 de Maio de 1738.Toda a sua vida monástica se desenvolveu em torno da imagem do Santo Cristo.
Em 1713 o SSC passa a acrescentar a designação “dos Milagres”, após a procissão que um grupo de freiras do Convento da Esperança organizou pelas ruas de Ponta Delgada, devido à grande crise sísmica que afectava a ilha de S. Miguel. Durante a procissão um abalo forte fez cair a imagem do Senhor Santo Cristo do andor, que no entanto, não sofreu qualquer dano, tendo a crise sísmica terminado, pelo que o povo clamou ser um milagre. A partir de então passou a designar a imagem por Senhor Santo Cristo... dos Milagres!
Quando a Madre Teresa entrou para o Mosteiro da Esperança, estava no coro baixo de um dos lados, num pequeno altar, uma imagem do Senhor, no passo do "Ecce Homo", que tinha um registo a tapar a abertura do peito, pois outrora servira de sacrário.
Durante a leitura do livro são-nos descritas as “conversas” que o Santo Cristo tinha em privado com a Madre Teresa e as exigências que por seu intermédio fazia, quer à comunidade monástica quer ao Conde da Ribeira Grande quer ainda aos artífices de quem pretendia um serviço.
A Imagem do SSC estava num altar, mas o tecto do coro era formado pelo soalho do coro alto que, além de velho, tinha muitas frinchas que deixavam passar o pó, além do barulho que se sentia quando se andava no coro alto. Teresa conseguiu que fosse construída uma capela convencendo as irmãs de que o SSC lhe teria dito:” Avisa da minha parte o Provincial que quando vier a capítulo exponha às Religiosas a indecência com que se acha a minha imagem e que as persuada a que concorram com as suas esmolas para se fabricar uma capela por detrás do coro e ao lado uma sacristia com seu jardim para as flores do meu altar”. (pag 65)
Nenhuma dessas capelas chegou aos nossos dias, mas sim uma terceira, mandada construir posteriormente e que foi benzida a 22 de Março de 1771.
É o Santo Cristo que encomenda à Madre: “ Teresa toma medida do pavimento da capela e dize ao Conde que desejo me ofereça uma alcatifa que tem em casa e me serve para esta capela” (pág.75). Como se o Santo já não conhecesse a medida nem o estado da referida alcatifa! Como a que estava em casa do Conde estava surrada, este ofereceu uma nova que comprou.
Logo na página seguinte o SSC lhe diz: “Filha, não te mortifiques eu não quero do Conde só a alcatifa porque o escolhi para muitas obras do meu agrado” (pag 76). Quis depois a “serva de Deus” uma grade por que o SSC lha pedira. A Abadessa chamou-a e reprimiu-a em termos violentos chamando-a de “ fingida, hipócrita e embusteira que aquela resolução era mais um capricho do seu alvedrio que obséquio à santa imagem, que com inaudita soberba andava sempre inventando novos modos de conciliar os ânimos seculares principalmente o dos Condes, os quais com a sua hipocrisia queria atrair e enganar” (pág.77). Pudera quem mais dinheiro possuía do que os Condes para satisfazer os desejos da “Venerável”!
Desobedecendo, fez a Madre chegar ao Conde a suposta mensagem do Senhor e este acabou por convencer a furiosa Abadessa a conclui-la.
Depois chegou a hora em que o SSC exigiu “que Madre Jerónima do Sacramento lhe fizesse um andor com um dossel que ele a inspiraria”(pág.84) pelo que a “Venerável “ assim o fez. Curiosamente o único trabalho da “serva do senhor” era encomendar a este e aquele esta e aquela obra, ficando ela sempre com o papel de simples transmissora de ordens. Toda a sua vida foi mais “Maria para o descanso do que Marta para o trabalho”, o que causava na comunidade algumas dissidências.
Terminada a capela exigiu por várias vezes o SSC: “Teresa eu quero um resplendor” (pág.111). Para tal a “serva de Deus” foi pedindo às outra monjas objectos de prata e exigindo das suas famílias objectos com que satisfizessem a vontade do SSC. Uma que tinha uma boceta de prata de que não se queria desfazer prometeu dar-lhe o correspondente em dinheiro. Não satisfeita, a Venerável dizia e voz alta pelo convento: “Já o Senhor tem tanta prata mas ainda lhe falta uma boceta que lhe há-de ser dada ou por bem ou por mal”. Uma vez que a religiosa foi acometida de cólicas violentas lembrou-lhe a Venerável a profecia e a infeliz lá lhe deu a boceta ficando sem a boceta e sem o dinheiro que já tinha oferecido. (pág 114). Quando o ourives a quem foi encomendado o resplendor lhe pediu um preço que considerou exorbitante ameaçou o infeliz através do conde da Ribeira Grande “ Conde …..diga-lhe V.Exª que ceda desse preço e se não o quiser, tudo quanto lhe pedir lhe dê, mas que depois não se queixe que suposto este meu Fidalgo em tudo é misericordioso, também castiga os agravos que se lhe fazem”. Chantagem? Efectivamente quando, estando a mulher do ourives acometida de terríveis dores de parto por tempo prolongado, lhe deu o Conde um pedaço da corda do SSC tendo sido o parto bem sucedido. O ourives não cobrou honorários pelo seu trabalho, não fosse a vingativa Madre “rogar-lhe outra praga”!
Depois o SSC, sem o pedir, deu um sinal à Madre que queria uma corda de ouro (!) e para isso concorreram diversas esmolas como o aljôfar que ele próprio teria indicado estar na posse duma das devotas de nome Mariana.
Muitas e muitas mais exigências e milagres nos são descritos no fabuloso livro do Padre Clemente, suspensão da chuva, confeites miraculosos, água miraculada que salvou um boi exausto nas obras do SSC, vingativas doenças sobre os que não cumpriam as determinações da Madre….
A imagem que os Evangelhos nos dão de Cristo, é a de um revolucionário, defensor dos pobres e desfavorecidos, desprovido de toda e qualquer ambição material, pregador do amor ao próximo, misericordioso, justo, etc. A imagem de Cristo que nos dão, quer o padre quer a própria Madre Teresa é a antítese de tudo isto. É-nos apresentada uma imagem de um Cristo sem a mínima preocupação social ou teológica, unicamente preocupado com os seus bens materiais (a capela, o soalho, a alcatifa, o resplendor, o retábulo, etc.), vingativo, exercendo chantagem sobre aqueles de quem pretendia um bem. Como se isso fosse possível em Cristo. No fundo a imagem que nos é revelada não é a de Cristo mas, a meu ver, a da infelizmente célebre “Venerável” Madre Teresa da Anunciada impulsionadora do culto do chamado Senhor Santo Cristo dos Milagres.
Não creio que o Eça alguma vez tenha lido este livro. Mas que o seu Zagalo se assemelha muito ao Padre Clemente, não tenho dúvida!
Que me perdoe o meu bom amigo Hugo Moreira, lá onde estiver, que tanto lutou pela beatificação da “Venerável” e que me ouvia, incrédulo e pacientemente, as minhas sacrílegas opiniões sobre a Madre Teresa.

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Mudanças

Vamos lá ver se as experiências pegam...
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sexta-feira, maio 14, 2004

Por pura provocação e puro gozo

Porque a provocações do André eu não resisto, aqui fica esta brincadeira.

Hero. Role model. Gay as houses.
Which Famous Homosexual are you?
Brought to you by Rum and Monkey

The chaplain to the New York Fire Department was tragically killed when one of the World Trade Centre towers collapsed on September 11, 2001. You provided years of Christian service, and will be remembered forever for your heroism.
You're also gay.
You provided a home for an AIDS ministry; you funded and supported the gay-friendly Queens St. Patrick's Day parade; you stood against a prominent Cardinal on a 1986 gay rights bill and were falsely accused of child molestation as a result. You rule.

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quinta-feira, maio 13, 2004

O que é não ter Liberdade

Independentemente da qualidade, do carácter ofensivo e da veracidade do artigo de Larry Rohter publicado "New York Times" (que ainda não li), a suspensão do visto que conduz à imediata expulsão do jornalista é um acto despótico e indesculpável.
A liberdade de imprensa deve existir. O senhor jornalista estava, pois, no seu direito de escrever o que lhe desse na real gana.
Mas se essa gana excedesse os limites da sua própria liberdade - porque esta deve existir, mas tem limites - qualquer visado teria o direito de reagir pelas maneiras que a todos são acessíveis: direito de resposta e acções judiciais.
Só que o Governo do Brasil "prescindiu" destes meios intervindo, pasme-se, "punindo" por via de acto administrativo da suspensão do visto.
Num pretenso Estado Direito, em que supostamente os poderes executivo, legislativo e judicial são independentes, não é aceitável que o poder executivo faça justiça em própria causa, exercendo ilegitimamente poderes que, em abstracto, lhe assistem.
Isto é o exemplo de actos ditatoriais e despóticos que se praticam em Democracia. Contra a Liberdade.

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Será?

Papa vai dizer a Bush que errou
E será que Bush vai perceber?
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quarta-feira, maio 12, 2004

Que "leader" sou eu?

Para uns, é entretenimento em insónia.
Para mim, uma pausa kit-kat.



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terça-feira, maio 11, 2004

A autonomia em força

Em ano de eleições regionais, serão bandeira eleitoral as alterações constitucionais tão bem esmiuçadas aqui?
O esvaziamento de poderes do Ministro da República (agora Representante da República) a par do alargamento de poderes legislativos regionais parecem-se, sem dúvida, uma conquista autonómica.
Quanto ao Ministro da República, contrariamente ao defendido por Vital Moreira, não me choca o esvaziamento dos seus poderes e a "igualização", no que às intervenções do Presidente da República respeita, entre as instituições dos governos regionais as instituições do governo da República.
Pelo contrário. Tal parece-me contribuir para uma maior unidade e igualdade, quer na exigência, quer no tratamento, das atitudes e responsabilidades políticas que se devem pretender idênticas (ainda que com amplitudes geográficas diversas) entre entidades governativas. Se me parece chocante termos um Ministro do Governo da República que, em "serviço" conta anedotas menos aconselháveis, não me parece menos chocante termos um Presidente de um Governo Regional que de uma forma não menos aconselhável e em público (sendo de resto transmitido pela televisão) qualifica os políticos seus pares de terem atitudes de mariquices e outros termos que tal. Ao menos que, em momentos de crise governativa ou não (como os acabados de descrever, que não sendo de crise, são de choro!),se centrem numa só entidade os poderes de intervenção.
O que não me parece curial é, com o esvaziamento, manter-se o cargo do Representante da República, com toda a estrutura de custos que tal implica...
Subscrevo, porém, a opinião de Vital Moreira quanto à eliminação da intervenção excepcional nas regiões autónomas em caso de violação grave da Constituição e quanto à ampliação dos poderes legislativos, exactamente porque fragmentam e desunem o que ainda é Português.

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Défices

Enquanto a UE perdoa os défices excessivos face ao Pacto de Estabilidade e Crescimento, a OCDE augura que os défices excessivos continuarão.
Valerá a pena existirem sanções e recomendações quando unilateralmente um Estado pode não aplicar o Pacto e quando consensualmente as sanções e recomendações vão para a gaveta?
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Apoiado!

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Presenças e Ausências

Pedroso sai da prisão e apresenta-se na Assembleia da República.
Mas no Tribunal, onde estão a ser apreciadas condutas que lhe são imputadas, nem põe os pés.
Vá lá perceber-se.

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Thomas Hickling

Thomas Hickling nasceu em Boston, Massachusetts a 21-2-1745 e casou aos 19 anos com Sarah Emily Green de quem teve dois filhos: William e Catherine.
O Pai ,um gentleman inglês fiel ao seu Rei, temendo que viesse a ser preso e a colocar toda a família em posição difícil, uma vez que Thomas Hickling era partidário da revolução independentista americana, enviou-o para Ponta Delgada onde chegou em 1769, deixando a mulher e os dois filhos na América. Nunca mais voltou aos Estados Unidos.
Em 1778, após a morte da 1ª mulher, casou com Sarah Falder, que aqui arribara com os pais após um naufrágio, nascida em Filadélfia e de quem teve 14 filhos.
Nos Açores foi dos pioneiros na cultura e comércio da laranja entre os Açores, Inglaterra e a Rússia que floresceu no último quartel do séc. XVIII e primeira metade do séc. XIX. Foi um dos homens mais ricos dos Açores e possuía algumas das casas mais bonitas de S. Miguel, uma das quais a do hoje Hotel de S. Pedro, em estilo Georgiano colonial que começou a ser construído em 1812.
Desde 1770 se interessou pelas Furnas e foi o primeiro a descobrir o interesse do local como estância de termal, de veraneio e lazer. Construiu um pavilhão, jardim e tanque de água férrea a que chamou “Yankee Hall”. Em 1795, já depois da independência dos Estados Unidos, foi nomeado Cônsul dos Estados Unidos nos Açores e Conselheiro em Portugal, cargo que se manteve na família por mais de 100 anos e, posteriormente, cônsul da Rússia.
Uma das mais notáveis residências que aqui construiu, por volta de 1802, foi a da Quinta da Glória, em Rosto de Cão. Para tal empreendimento mandou vir mestres dos Estados Unidos que colaboraram com artesãos locais. Tinha esta casa um dos mais bonitos jardins de S. Miguel, hoje totalmente desaparecido. Visitei esta esplêndida residência há 20 anos e, apesar da degradação e abandono a que inexplicavelmente está votada, continua a ser, ainda hoje, um magnífico exemplar de arquitectura pela sua beleza, funcionalidade e qualidade de construção.
Duas das suas filhas, Elisabeth e Anne, casaram com William Ivens, um inglês aqui chegado em circunstâncias rocambolescas. Elisabeth foi avó do grande explorador do séc. XIX Roberto Ivens.
A filha do 1º casamento de Thomas Hickling, Catherine, visitou-o em S. Miguel em 1786, praticamente para o conhecer, uma vez que ficara a viver com os Avós nos Estados Unidos. Thomas Hickling tentou que aqui casasse para poder ficar perto dele. Efectivamente aproximou-a Inácio José de Sousa Coutinho, filho do capitão-mór de Santa Maria e então morador na Rua do Contador, na casa depois pertencente ao 1º Conde de Albuquerque e hoje na posse dos seus herdeiros.
A jovem Catherine descreve este seu namoro num diário, publicado na “Insulana” (vol. XLIX ,1993), mas Inácio José de Sousa Coutinho quando seguia acompanhado por seu primo Pedro Nolasco Borges Bicudo da Câmara e por Francisco Jerónimo Pacheco de Castro, foi assassinado no canto da Rua da Cruz, em Ponta Delgada, a 19 Fevereiro 1787, numa 2ª feira de Entrudo, por Manuel da Câmara Coutinho Carreiro, amigo íntimo de Gaspar António de Medeiros Sousa Dias da Câmara. Embora o criminoso se encontrasse em manifesto estado de embriaguês na ocasião do crime, diz-se que a ele fora instigado por Gaspar António que pretendia Inácio José para marido de sua irmã Francisca Miquelina de Montojos Paim da Câmara. Por tal motivo e por se lhe terem atribuído graves responsabilidades na prática deste crime, Gaspar António chegou a estar preso (Vid. "Arquivo dos Açores", Vol. XV, pág. 99; e "Insulana", Vol. XII, pág. 119) e faleceu solteiro, deixando a sua grande casa à sua sobrinha D. Ana Teodora, mais tarde Viscondessa da Praia.
Catherine Hickling acabou por regressar aos EU, onde casou com o Juiz William Prescott e foi mãe do famoso historiador americano William Hickling Prescott que visitou o Avô em S. Miguel (1815/16) para tentar restabelecer-se de uma grave doença oftálmica que o afectou.
Curiosamente foi o Visconde da Praia, casado com a sobrinha e herdeira de Gaspar António, quem comprou duas das casas de Thomas Hickling, o Yankee Hall e a da Quinta da Glória. O 1º Marquês da Praia, António Borges Medeiros Dias da Câmara e Sousa, filho do Visconde, fez construir, no local do “Yankee Hall”, o belo palacete que ainda hoje existe no “Parque das Furnas”, onde foi recebido o Rei D. Carlos durante a visita a S. Miguel. A Quinta da Glória ainda hoje está na posse dos herdeiros do Marquês da Praia.
Thomas Hickling faleceu em 1834 e está enterrado no cemitério inglês de Ponta Delgada, deixando numerosa descendência nos Açores e Estados Unidos.


(Insulana, Genealogias de S. Miguel e Santa Maria, Os Ivens-Ferraz, Arquivo dos Açores)
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domingo, maio 09, 2004

Bom senso e bom gosto

Em apoio da “Carta Aberta, ou à berta” do Pedro no :ILHAS

O desrespeito pelo património arquitectónico urbano não é do PPD, do PS, da República ou da Monarquia, da direita ou da esquerda. Existe cá, como em Lisboa, Paris e talvez menos em Londres.
Lisboa era uma cidade curiosa. Dos bairros antigos que sobreviveram ao terramoto, felizmente anda ficou alguma lembrança, Mouraria, Alfama, Bairro Alto, etc. A ampla visão do Marquês reconstruiu o que já não existia em moldes modernos e lineares que ainda hoje persistem, com um ou outro atentado patrimonial. Mas Lisboa tinha uma característica, a meu ver ímpar. Era a distribuição concêntrica a partir do Terreiro do Paço das diferentes épocas. O séc. XVIII no Terreiro do Paço e arredores, o séc. XIX a partir do antigo Passeio Público (Restauradores e Avenida da Liberdade), O sec. XX nas Av. Novas, etc. Hoje a tendência é destruir o existente considerado sem valor, excepto a obra do Marquês, por enquanto considerada única e intocável.
Aqui em S. Miguel também esta atitude tem sido desde sempre tomada por diferentes personagens de diferentes origens sociais e culturais. Ambição política? Falta de senso? Ausência de gosto e educação estética? Interesses imobiliários? Talvez um pouco de tudo.
Destruiu-se o Convento de S. João para ser aproveitado para quartel no séc. XIX e o que restou que ainda era muito, foi demolido no séc. XX para se fazer um Teatro e agora um Centro Cultural.
Destruiu-se o Aterro, a Varanda de Pilatos e o pitoresco Cais da Alfandega para se construir uma insípida Avenida Marginal e um pastiche do Terreiro do Paço.
Destruíram-se as pitorescas lojas no andar térreo do lado sul do adro da Igreja da Matriz.
Destruiu-se o Convento dos Franciscanos do séc. XVIII, para se fazer uma frontaria neoclássica para a nova Misericórdia. A antiga foi pura e simplesmente demolida, para dar lugar ao bonito edifício da Casa Bensaúde, mas a memória da velha Misericórdia pura e simplesmente desapareceu. Custa a acreditar que o antigo edifício da velha e rica Santa Casa, fosse um simples pardieiro indigno de ser recuperado!
Destruiu-se e profanou-se a Igreja e o Convento dos Gracianos para fazer um liceu, depois um tribunal e depois uma Academia das Artes, com estruturas de betão de gosto duvidoso e a meu ver inapropriadas para o espaço onde se insere e a que se destinava, pouco restando do bonito edifício que primitivamente foi. Do claustro fez-se um auditório que pouca ou nenhuma utilidade tem. Da cerca fizeram no séc. XIX o único mercado rústico que Ponta Delgada tinha e que há poucos anos foi “vandalizado” por um “artista” iluminado, com o consentimento dum Presidente da Câmara sonâmbulo.
O bonito jardim do Palácio do Marquês da Praia foi destruído para nele se instalar o inestético edifício do Tribunal. Se tivesse sido um privado a querer construir um bonito prédio de rendimento seria com certeza chumbado por atentar contra o património
A velha ermida da Rua da Misericórdia foi arrasada para se fazer um armazém e agora, julgo eu, uma garagem, para uma importante empresa comercial local.
A ermida da Trindade foi trasladada e escondida na Lombinha dos Cães, para em seu lugar se construir um duvidosíssimo edifico de escritórios.
Destruiu-se também um bonito solar do séc. XVIII em plena Avenida Marginal para se fazer um moderno Hotel. Este, lembro-me eu bem, seria facilmente recuperável, não fossem os interesses imobiliários em jogo.
Permitiu-se a destruição do Paço dos Condes da Ribeira Grande no séc. XIX que seguramente seria digno de ser preservado, para construir o bonito palácio do Barão de Fonte Bela, hoje também ele arruinado pela sua transformação em Liceu. Não estaria este muito melhor apetrechado para ser palácio do então Governo Civil do que o desinteressante Palácio da Conceição, também ele resultante da destruição do Recolhimento da Conceição, anexo à igreja felizmente ainda hoje conservada. Até que algum político “desinteressadamente” a venda para lá instalar um restaurante, um bar ou uma discoteca? Hoje o Palácio Fonte Bela ainda ali poderia estar em toda a sua plenitude.
Todas as grandes casas de difícil e cara manutenção, dificilmente se conservam para as futuras gerações se não tiverem espaço em seu redor que permita a sua adaptação a hotéis de charme com jardins envolventes e a existência de actividades de lazer como ténis, croquet, piscinas, picadeiros, etc. Foi o contrário precisamente que fizeram os nossos preclaros urbanistas com a antiga casa dos Condes do Botelho, no Livramento. Fizeram passar a via rápida o mais perto possível das janelas daquela bonita casa cortando todo o espaço envolvente de tal modo que no futuro a casa estará destinada à destruição pela impossibilidade de com dignidade a manter.
É o que irá seguramente acontecer ao Solar das Necessidades, porventura a mais bonito exemplar de arquitectura civil do séc. XVIII nos Açores, pelos enormes entraves que são impostos para a sua transformação em hotel, ainda que seja essa a única alternativa à sua destruição.
Se um cidadão quiser fazer uma retrete em casa, tem de esperar meses por uma autorização da Câmara, supostamente para o obrigar a cumprir a lei. Contudo o que se assiste é que os maiores vandalismos são impunemente cometidos desde sempre pelas próprias Câmara e Governos, à margem das leis, do bom senso e do bom gosto, quando não por cedências, seguramente não inocentes, aos lobbies da construção civil e ao poder económico. O que não quererá dizer que se aceite sem reparo todos estes atentados.


Carlos F. Afonso
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segunda-feira, maio 03, 2004



Ou ganham os melhores ou os sortudos.
Parabéns aos benfiquistas, pela sorte.
O meu especial repúdio para os adeptos que, para além de não saberem perder (parece que não viveram os 18 anos de espera...), se portam como vândalos (que se calhar o são).

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domingo, maio 02, 2004

Vasco Bensaúde, a propósito de "Um grande hotel de charme em São Miguel"

No meu reencontro com o João Vasconcelos Costa, na passada 6ª feira no Hotel de S. Pedro, falámos da construção do Hotel e da personalidade do seu culto dono, o Sr. Vasco Bensaúde. Disse-me que iria escrever um post sobre o hotel e a sua construção e sugeriu-me que aqui escrevesse uma pequena história de Vasco Bensaúde.
Foi ele o herdeiro acidental da imensa fortuna do seu tio Henrique Bensaúde que não tendo herdeiros directos, resolveu visitar os sobrinhos para escolher, qual deles seria o melhor continuador dos seus negócios. Vasco Bensaúde, filho do notável investigador da História dos Descobrimentos Portugueses Joaquim Bensaúde, estudava então na Suíça. Impressionou de tal modo o velho tio com a sua modéstia, cultura e notável minúcia, tornando-se o único herdeiro da sua formidável fortuna. Só que o arguto judeu não percebeu que o sobrinho não tinha qualquer inclinação para negócios e dinheiro, nem tão pouco tinha qualquer prazer ou ganância em o adquirir. Muito novo e de surpresa, viu-se Vasco Bensaúde possuidor de uma enorme fortuna.
Modestamente encomendou ao primo José Bensaúde que vivia nos EUA, uma moto para se deslocar para os escritórios. O primo, na volta do navio, enviou-lhe um luxuoso carro americano que deixou VB horrorizado sem saber se teria dinheiro para o pagar!
Conta-nos Joaquim Paço d’Arcos, nas suas “Memórias da minha vida e do meu tempo”, que no princípio dos anos 20 VB era a maior fortuna do País. Nessa altura um dos muitos e transitórios Governos da 1ª Republica, pretendeu contrair um empréstimo de 20.000 contos sobre o Banco da Inglaterra. O Governo Inglês só o permitiu – imagine-se – com o aval do Sr. Vasco Bensaúde! Um privado tinha mais crédito do que o próprio Governo!
Por esse motivo dirigiu-se V.B. ao Banco para falar com a Administração. Joaquim Paço d’Arcos ficou espantado que aquele desconhecido e despretensioso homem de boina, modestamente vestido, com sotaque estrangeiro que timidamente pedia para falar com a Administração para lhes conceder o desejado aval, fosse o homem mais rico do País e casado com uma elegante senhora que via passear no Chiado num luxuoso automóvel. Foi assim toda a vida. Tímido, educadíssimo, impunha-se pela sua inteligência e cultura.
Preocupava-se muito mais com a beleza das coisas e com o prazer que lhe causavam, do que com os proventos que com isso pudesse obter. O Hotel de S. Pedro é disso um notável exemplo.
Prestava mais atenção às lindíssimas roseiras do seu magnífico jardim do que aos negócios que as proporcionavam. Para isso montou no terraço da sua casa do Pico Salomão uma pequena estação metereológica e ensinou o seu feitor, o bom e analfabeto David, a mandar diariamente leituras de pluviosidade, ventos e pressões, para que em Lisboa soubesse das condições em que se desenvolviam as suas flores!
Não tenho dúvidas que foi merecedor de ser o herdeiro da fortuna do Sr. Henrique Bensaúde, mas seguramente não pelos motivos que aquele ilustre homem de negócios pretendia.


Carlos Falcão Afonso
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Aos pés
deitado
um cão de fila.
Sentada, borda a matiz a mulher
que o olha eternecida.
É ele a sua companhia.
Para além da janela, bate o vento.
A chuva é forte.
Revolto o mar.
... Mas, o cão dorme.


(Vitor de Lima Meireles, O Todo a Parte Alguma)

Todos os dias são este dia.
Oficialmente comemora-se hoje. Tu comemoras dia 8 de Dezembro.
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sábado, maio 01, 2004

Liberdade

Cheguei tarde ao desafio da Mariana
Liberdade devia Ser e não Ter.
Tenho Liberdade mas anseio que ela, a minha e a de todos vós, Seja.
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Uma crítica mordaz, hilariante, sobretudo aos políticos do nosso país mas também aos executivos e aos humoristas.
Uma grande revelação em comédia foi Virgílio Castelo.
A personagem que representa, o ministro Óscar Brito, é muito parecida - na fala e postura (mas não nos miolos e na integridade) - com uma pessoa que conheço. Não sei se não vou rir quando ouvir esta pessoa que conheço...
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A democracia já não é o que era

CAPITÃO-DONATÁRIO JOÃO SOARES DE SOUSA — Exemplo de democracia, de bondade e generosidade
O Capitão João Soares de Sousa, faleceu em Vila do Porto com perto de 78 anos, no dia 2 de Janeiro 1571 (...). Segundo uma nota histórica de José de Sousa, publicada no suplemento “Santa Maria”, do “Correio dos Açores”, em Fevereiro de 1971, o 3º Capitão-do-Donatário de Santa Maria foi o primeiro nascido nesta ilha.
Filho do Capitão João Soares de Albergaria e de D. Branca de Sousa Falcão, nasceu em Vila do Porto, por volta de 1493. (...)
João Soares de Sousa tinha cerca de seis anos quando seu pai faleceu, pelo que ficou a governar a ilha de Santa Maria, durante a sua menoridade, João de Marvão, escudeiro da Casa Real e Almoxarife em Vila do Porto.
O capitão João Soares de Sousa, muito entendido na arte náutica, era um homem de elevada estatura, trigueiro, forte e animoso, bom fidalgo e muito caritativo. Naqueles recuados tempos em que o aforamento era quase uma escravidão, revelou possuir um espírito verdadeiramente democrático. Senhor de vastas propriedades, nunca as arrendava a um só rendeiro, mas a muitos, para remediar a todos. Se o rendeiro lhe devia trinta alqueires de trigo e era pobre, com cinco lhe pagava: sendo senhor de todos os moinhos, cada um lhe pagava o que queria e nunca mandou citar alguém por dívida. Era tão recto, na administração da Justiça, que nunca deu sentença que na Relação lhe fosse revogada.
Este 3º Capitão Donatário de Santa Maria era tão esmoler que, em certo ano, que fome grassava naquela ilha, mandou deitar pregões pelas freguesias para que os necessitados pudessem ir aos seus rebanhos buscar ovelhas, apenas lhes pedia que lhe dessem as peles e a lã.
João Soares de Sousa casou em primeiras núpcias, com D. Guiomar da Cunha da Ilha filha de Francisco da Cunha primo do Vice-Rei da Índia D. Afonso de Albuquerque e de D. Brites da Câmara, neta do 1.º Capitão Donatário do Funchal, João Gonçalves Zarco.
Falecida a primeira mulher, casou com D. Jordoa Faleira, filha Fernão Vaz Faleiro, tabelião em Vila do Porto, e de Filipa de Resende. Morta a segunda mulher, casou, em terceiras núpcias com D. Maria de Andrade filha de Nuno Fernandes Velho, senhor do vínculo de Larache
Dos numerosos filhos do Capitão João Soares de Sousa, todos ilustres pelos seus feitos e virtudes, merecem especial referencia os seguintes: - Pedro Soares de Sousa que sucedeu ao seu pai no governo da Capitania ; Manuel de Sousa que batalhou em França e Itália e no cerco de Tunes, combateu, às ordens do Imperador Carlos V, e que, ao regressar a Santa Maria, depois de trinta e cinco as anos de ausência, morreu em. combate contra os corsários franceses que incendiaram Vila do Porto; D. Joana de Sousa que, de casou com Heitor Gonçalves Minhoto, homem muito rico que, segundo a opinião do cronista Gaspar Frutuoso, se mais vivera acabaria por comprar inteira; Rui de Sousa que morreu em combate na Índia; e André de Sousa que casou com D. Mécia de Lemos, irmã do ilustre mariense D. Luís de Figueiredo Lemos, que foi Bispo do Funchal.
O Capitão João Soares de Sousa. gastou grande parte da sua fortuna na prática constante da caridade. Está sepultado na capela-mor da Igreja Matriz de Nossa Senhora da Assunção Vila do Porto, junto a porta da sacristia onde estão também sepultadas as suas duas primeiras mulheres. Na Rua de Frei Gonçalo Velho, em Vila do Porto, existiam as ruínas da casa onde a tradição diz que viveu o Capitão Soares de Sousa. Há anos, foi alvitrado, em vão, que estas ruínas, muito curiosas pela desigualdade existente entre as cinco portadas que lhe davam acesso, fossem restauradas e utilizadas com o nome de “Museu João Soares de Sousa” .
Quando da visita dos intelectuais aos Açores, em 1924, o grande escultor Mestre Teixeira Lopes desenhou essas portadas. (...)

por M. J. ANDRADE Açoreano Oriental de 6 de Janeiro de 1995

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