quinta-feira, julho 15, 2004

Retalhos da vida de meu Pai (III)

O Prof. Francisco Gentil, fundador do IPO, foi um extraordinário organizador e gestor, sendo percursor de muitos dos actuais métodos de avaliação e de controlo de qualidade. Numa época em que os Hospitais Públicos eram quase inutilizáveis, pela carência de meios, instalações impróprias e imundície, o IPO apareceu como instituição modelar, nas instalações, limpeza e funcionamento. Sendo amigo pessoal do Dr. Salazar conseguiu meios de financiamento invejáveis. Mas ao mesmo tempo acolheu no IPO muitos dos médicos perseguidos e exonerados pelo regime, como o Prof. Fernando da Fonseca, expulso da Universidade pela sua oposição a Salazar.
Geriu o IPO despoticamente, com mão de ferro, e não raro percorria as enfermarias com o traje do Bloco Operatório, um longo avental até aos pés e barrete, indagando junto dos doentes as suas queixas em relação ao funcionamento, comida e tratamento.
Desde sempre os políticos se serviram dos sucessos alheios, tomando-os como próprios e usaram-nos e usam-nos como instrumento de mera propaganda. Se hoje em dia são os médicos acusados de todas as maleitas que enfermam o SNS, naquele tempo as acusações eram mais contidas, dadas as tão óbvias carências que urgia esconder, só se publicitando, em termos encomiásticos, os benefícios do regime.
Numa época, ainda antes do aparecimento da TV, a antiga Emissora Nacional foi fazer uma reportagem ao IPO, para propagandear, com o alarde possível na altura, o grande e avançado Hospital que o Estado Novo proporcionava. O repórter entrevistou médicos, enfermeiros e doentes sobre as condições de trabalho, funcionamento e higiene do IPO, etc.
Um dos doentes interrogados referiu-se em termos superlativos ao funcionamento do Instituto, aos médicos, às enfermeiras, ao pessoal, etc. No auge do seu entusiasmo e para mais convincente se tornar, afirmou: “ Ó senhor, este Hospital é tão bom que até o cozinheiro veio ontem falar comigo para saber se eu tinha gostado da comida”!
O solícito “maitre” era tão só o Prof. Francisco Gentil!


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