Por apenas dois copos de vinho
Em Agosto de 1983 fui de férias a Londres e, por pouca sorte, apanhei uma enorme vaga de calor como
- dizia-se - não havia memória nos anteriores 50 anos. Não que a temperatura fosse para nós excessiva (34ºC), mas Londres é uma cidade reconhecidamente impreparada para o calor. Sem ar condicionado, sem bebidas frescas e até a desejada cerveja é servida quente! Fui, acidentalmente, à Burlington House em Picadilly, à exposição de Verão da Royal Academy of Arts. Exposição ecléctica e grandiosa onde se expunham todas as tendências e movimentos artísticos, desde obras de vanguarda até a formais retratos e clássicas naturezas mortas e paisagens.
Antes de sair, exausto e sequioso, deparei com uma pequena escada com um letreiro e uma seta que dizia “Mandela”. Julgando tratar-se de uma exposição de pinturas esotéricas ou orientais, subi e ao entrar deparou-se-me uma bonita e sorridente jovem que, de bandeja na mão, oferecia copos de vinho branco gelado! De um golo sorvi logo um copo. Passeei-me pela exposição fingindo-me interessadíssimo, mas com a ideia fixa de beber um segundo copo, o que, depois de um primeiro visionamento, sofregamente fiz. A exposição era um misto de desenhos infantis e pinturas com referências à liberdade e ao apartheid.
À saída vieram pressurosamente entregar um livro para assinar, com uma petição para libertar Nelson Mandela. Depois de dois copos de vinho branco gelado, debaixo de um calor abrasador, eu assinava o que quer que fosse. Desde a beatificação do Bin Laden à libertação do estrangulador de Boston.
Só mais tarde vim a saber quem era Nelson Mandela e não me arrependi de ter assinado a petição. O que Nelson Mandela provavelmente nunca soube foi que, em Londres ou na própria África do Sul, deve haver escondido um livro, assinado por um sequioso turista a quem ficou a dever a sua libertação, por apenas dois copos de vinho branco gelado! Eu que até sou abstémio...
Carlos Falcão Afonso
É verdade que sempre te conheci abstémio mas em viagem toda a transfiguração (ou quase toda) é permitida. E já te conheci algumas ;-).
Essa de matares a sede, em calores abrasadores, com um copo que contenha uma percentagem (nem que seja percentagenzinha) de alcool é uma delas, e que grandes sustos valeu ao nosso miúdo.
Quanto ao abaixo assinado, Mandela provavelmente também não saberá que existirá um livro (talvez o mesmo) que em 1987 também foi assinado por uma miúda em Londres, que não viu exposição nenhuma, nem bebeu vinho...
- dizia-se - não havia memória nos anteriores 50 anos. Não que a temperatura fosse para nós excessiva (34ºC), mas Londres é uma cidade reconhecidamente impreparada para o calor. Sem ar condicionado, sem bebidas frescas e até a desejada cerveja é servida quente! Fui, acidentalmente, à Burlington House em Picadilly, à exposição de Verão da Royal Academy of Arts. Exposição ecléctica e grandiosa onde se expunham todas as tendências e movimentos artísticos, desde obras de vanguarda até a formais retratos e clássicas naturezas mortas e paisagens.
Antes de sair, exausto e sequioso, deparei com uma pequena escada com um letreiro e uma seta que dizia “Mandela”. Julgando tratar-se de uma exposição de pinturas esotéricas ou orientais, subi e ao entrar deparou-se-me uma bonita e sorridente jovem que, de bandeja na mão, oferecia copos de vinho branco gelado! De um golo sorvi logo um copo. Passeei-me pela exposição fingindo-me interessadíssimo, mas com a ideia fixa de beber um segundo copo, o que, depois de um primeiro visionamento, sofregamente fiz. A exposição era um misto de desenhos infantis e pinturas com referências à liberdade e ao apartheid.
À saída vieram pressurosamente entregar um livro para assinar, com uma petição para libertar Nelson Mandela. Depois de dois copos de vinho branco gelado, debaixo de um calor abrasador, eu assinava o que quer que fosse. Desde a beatificação do Bin Laden à libertação do estrangulador de Boston.
Só mais tarde vim a saber quem era Nelson Mandela e não me arrependi de ter assinado a petição. O que Nelson Mandela provavelmente nunca soube foi que, em Londres ou na própria África do Sul, deve haver escondido um livro, assinado por um sequioso turista a quem ficou a dever a sua libertação, por apenas dois copos de vinho branco gelado! Eu que até sou abstémio...
Carlos Falcão Afonso
É verdade que sempre te conheci abstémio mas em viagem toda a transfiguração (ou quase toda) é permitida. E já te conheci algumas ;-).
Essa de matares a sede, em calores abrasadores, com um copo que contenha uma percentagem (nem que seja percentagenzinha) de alcool é uma delas, e que grandes sustos valeu ao nosso miúdo.
Quanto ao abaixo assinado, Mandela provavelmente também não saberá que existirá um livro (talvez o mesmo) que em 1987 também foi assinado por uma miúda em Londres, que não viu exposição nenhuma, nem bebeu vinho...
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