terça-feira, julho 27, 2004

Retalhos da Vida de meu Pai (IV)

Reinaldo dos Santos foi das maiores figuras médicas do séc. XX, com um prestígio internacional invejável, ainda que nunca tenha recebido um prémio Nobel. Dele conhecemos o extraordinário curriculum científico e o seu reconhecido mérito como professor, investigador e cientista.
Formou um escol de cirurgiões de prestígio - trabalhando no velho e decrépito Hospital de Arroios - e todos os que foram alguém na Cirurgia do séc. XX em Lisboa, passaram por essa Escola ou foram formados por alguém que a tivesse frequentado. Lembremos tão-somente a aortografia translombar, por ele criada e descrita em 1929, a flebografia e a endarterectomia, criadas e descritas pelo seu filho em 1937 e 1946, o nosso brilhante professor de Clínica Cirúrgica João Cid dos Santos e que foram técnicas fundamentais e percursoras de toda a cirurgia vascular. Terão sido estes 20 anos, juntamente com o Nobel de Egas Moniz em 1949, os momentos mais altos da cirurgia portuguesa do séc. XX .
Para além de emérito professor, investigador e cientista, foi Reinaldo dos Santos um notabilíssimo crítico e historiador de Arte, numa época em que em Portugal quer a bibliografia quer o próprio estudo da História de Arte era muito pobre e mal estruturado. Espírito refinado e culto as suas publicações sobre Arte não desmerecem, pela quantidade e qualidade, das que publicou a nível científico.
Na altura em que ainda exercia medicina foi o Prof. Reinaldo chamado ao Hotel Avis, pelo seu amigo Prof. Fernando da Fonseca, médico assistente do Sr. Gulbenkian, para observar o seu ilustre doente que se encontrava em retenção urinária. Delicadamente o Prof. Fernando da Fonseca deixou o seu doente entregue ao Prof. Reinaldo enquanto este procedia à temida algaliação.
Subitamente o Prof. Reinaldo, com ar espantado, começou aos gritos. “Ó Fernando, Ó Fernando”. Esbaforido, temendo algum acidente, Fernando da Fonseca entrou pelo quarto, de rompante, para se inteirar do sucedido. Com um ar de espanto Reinaldo disse-lhe: “Mas afinal é só urina!”. Combalido e atarantado Fernando da Fonseca perguntou: “ Mas o que esperavas tu que fosse?”. “Petróleo!”, respondeu Reinaldo triunfante.
Consta que Calouste Gulbenkian, aliviado e de pernas abertas, riu a bandeiras despregadas!

(Publicado em comentário no Professorices)



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